Quero neste outro lugar acordar bem cedinho
Pra ver o Sol, a seda da manhã sutilmente descortinar
Antes que ele dissolva a tênue névoa, com o seu calor
Com paciência o café no coador de pano, esperar passar
Encher o bule de ágata verde e sentar na varanda
Enquanto o Sol se anuncia, o café na caneca saborear...
Quero daqui vislumbrar a extensão dessa campina
Que lá no horizonte esbarra com um céu de azul profundo
Deitar na relva e ficar quarando, imitando as roupas no varal
Dançantes sob o mesmo vento, que tange nuvens a cada segundo
Fechar os olhos na claridade e sentir ao redor toda dimensão
Pra esquecer que além dessas montanhas existe um mundo...
Quero caminhar sem pressa por essas tortas trilhas
Ver borboletas coloridas em seu vôo lúdico balançando
Ouvir passarinhos cantando nas copas das árvores ao redor
Pisar no caminho onde a última chuva caiu, o barro moldando
Seguir o barulho da cachoeira entre os verdejantes arbustos
Até descobrir sua nascente entre as pedras borbulhando...
Quero sentir o cheiro bom da comida feita no fogão à lenha
Panelas fervendo na trempe, anunciando a chegada do meio dia
Comer feijão tropeiro, com arroz branco, couve, linguiça e farinha
Suco de uma fruta da estação, doce de leite com queijo, me delicia
Depois da refeição, uma rede na varanda à "siesta" me convida
Um breve cochilo, enquanto entre os montes a luz do Sol jaz vadia...
Quero tomar banho nas águas doces que vem desse caudaloso rio
E à noite, com a volta do frio, uma cachaça de rolha pra esquentar
Ficar admirando no céu noturno o lume infinito das estrelas
Tendo a impressão que estendendo a mão, posso o brilho delas alcançar
Ouvir o cricrilar dos grilos na relva e ver as mariposas procurando a luz
Além das luzes das casinhas distantes e os vagalumes no breu a piscar...
Quero debulhar meus pensamentos na varanda, até alta noite-madrugada
Sentindo o sopro da brisa tremeluzir a chama mortiça do lampião
Perceber, além do calar das vozes, somente o som dos animais na mata
Receber o fluir sereno da paz, que há tempos faltava ao meu coração
Aguçar solenemente os sentidos e sentir flutuar meu espírito
Abraçar com paixão o silêncio... E dormir aninhado nos braços da solidão.
João C. Lima.