Corro meu olhar pelas ruas, e mesmo que não queira, não há como não ver...
São corpos jogados pelas calçadas.
Coisas que só viamos sob marquizes, ou em becos, guetos e vielas
Hoje vemos à luz do dia em qualquer calçada ou rua da cidade
Seja no Centro, Zona Norte ou Sul... Lá estão eles, corpos inertes nas calçadas
E o que nos dá asco, ao mesmo tempo nos dá pena, pavor e dor
De ver ali, seres humanos largados, jogados, dormindo ao relento, ao léu
Não mais em bancos de praças, mas em qualquer via pública, antes feita só para pedestres...
E como não ver... Ou como fingir que não vemos isso...
Não são uma, duas ou três pessoas...
São grupos, bandos, hordas de seres humanos largados pelas ruas
Deitados nas calçadas, nas ruas, avenidas, em meio a passagem
Sem nenhum pudor de ali estar, como se fosse a coisa mais normal do mundo dormir na rua
No chão sujo das calçadas...
Seres esfarrapados, sujos, envoltos em panos e trapos tão sujos quanto eles
Alguns bêbados, outros drogados, tomados pelo poder destrutivo do crack
E quando o efeito de tanta droga chega ao seu clímax, adormecem em qualquer canto da cidade
Como se fossem parte da grande casa que essas pessoas escolheram para morar
As ruas da cidade...
Observo que na maioria são negros, pardos, ou brancos, que de tão sujos tornaram-se cinzentos
Tão cinzentos que se confundem com as pedras portuguesas que decoram as calçadas da cidade.
Vejo-os sobre as grades do metrô, sob toda e qualquer marquize, sob os abrigos dos pontos de ônibus
Ou mesmo no meio do passeio público, que por ser público tornou-se a moradia desses párias...
E todo dia mais e mais seres humanos se aglomeram pelas ruas da cidade...
Sob os Arcos da Lapa, junto à Candelária, no Mergulhão da Praça Quinze, nos jardins e praças da cidade...
Qualquer lugar, qualquer rua, qualquer canto dessa metrópole podemos vè-los...
Perdidos, sujos, os vemos como se fossem extraterrestres, mas são humanos como nós
Mas nos causam medo, pânico, hojeriza, horror...
Avançam sobre os carros nos sinais, querendo um trocado para não depredar seu carro
Ou na falsa intenção de limpar seu párabrisas, com panos não mais sujos do que eles próprios.
Ainda há aqueles que catam lixo, são tantos catadores de lixo, mais catadores do que lixo!!!
E são muitos... Talvez dezenas, centenas, não sei...
Mas nada mais são do que o reflexo da farsa econômico-social em que vivemos
Se o Brasil cresceu tanto, se somos a sexta economia do mundo, se somos o país do futuro
Onde está o presente dessa gente? E quiçá seu futuro?
Se somos um país tão forte, porque há tantos fracos e fracassados?
Porque todo um sistema se corrói, se corrompe, e seres humanos como nós estão largados à sorte...
Muitos ainda sonham com o Sul Maravilha, ou são jogados aqui na cidade sem saber onde estão ou o porque...
Muitos perderam tudo que tinham, outros nunca tiveram nada e ainda há outros que não tiveram e nem querem ter nada, porque descobriram que viver assim é um grande "negócio"...
Aí vemos na televisão o Julgamento do Mensalão e sabemos que no fundo nada disso vai salvar esse país, por mais que corruptos e corruptores sejam presos, outros surgirão e os chefes, mestres e cabeças dessas quadrilhas continuarão impunes...
Continuaremos a acreditar que o Brasil é o país do futuro, continuaremos a acreditar que haverá um dia igualdade sobre essa terra, se nem ao menos saímos às ruas para lutar pelo que é nosso! Pela nossa dignadade! Pela nossa moral e respeito...
Enquanto isso as ruas desta cidade e de tantas outras cidades desse país, vão continuar a abrigar hordas de sem tetos, de pedintes, mendigos, párias, cracudos, seres perdidos, sem rumo ou destino, sem vida...
Me entristeço e me apavoro, porque talvez seja neste o país que minha filha, quando adulta, vai ter que viver... Com tantos seres jogados à sorte... Sujos, maltrapilhos, doentes, bebados e drogados, sem nenhum amor próprio ou pudor, sem rumo, tino ou direção... A pedirem um trocado ou a tomá-lo na força, porque assim é a lei que os rege... "Se nada temos, tomamos dos que tem..."
E as autoridades nada dizem... O Governo manipula resultados para ludibriar os tolos, e nós, um pouco mais esclarecidos, só temos ainda que nos indignarmos, como meio de demonstrar nossa ira contra tudo isso... Porque em breve, todos nós poderemos estar nas ruas, sob marquizes, dormindo ao relento, porque a mentira de alguns, lança muitos a uma verdade vil e cruel...
Olhe ao seu redor e veja quanta degradação humana te cerca... Juntos podemos dar um basta nisso e em tudo que corrói nossa sociedade... Pense nisso e reaja enquanto há tempo!
Beijos e abraços enfeitiçados.